Simbolismo
Precedentes
A partir de 1880, na França, ocorreu uma reação contra os pontos de vista cientificistas da elite intelectual da época, representadas na literatura pelo fatalismo naturalista e pelo rigor parnasiano.
Nesse sentido, o Simbolismo surgiu como uma recusa a todos os valores ideológicos e existenciais da burguesia, e não apenas como uma estética oposta à literatura, objetiva, descritiva e plástica, mais especificamente a poesia lírica.
Contexto Histórico
Após a Segunda Revolução Industrial, a economia mundial entra em crise. Houve aumento da concorrência e, com isso, falta de mercado consumidor. As empresas pequenas não conseguiram sobreviver, sendo encampadas pelas maiores, formando os trustes. O monopólio da comercialização de produtos com a formação dos cartéis limita as condições de venda e de pagamentos. O capitalismo não se desenvolve de maneira uniforme no mundo, gerando concentração de capital em países como França, Inglaterra e Estados Unidos, instituindo-se as grandes potências e o imperialismo econômico.
Sociedade e cultura
Com o capitalismo e a evolução da
ciência e da tecnologia, o mundo volta seu olhar para os interesses materiais.
Entretanto, a classe trabalhadora não obteve melhorias em suas condições de
vida, principalmente por causa da exploração de mão de obra como meio de
auferir grandes lucros pelos empreendedores capitalistas. Isso gerou
insatisfação e frustração ao homem comum, que passa a buscar conforto no lado
místico e espiritual do universo.
Tal busca pelo subjetivismo revela-se na arte como um retorno ao Romantismo, em que o anseio pelo refúgio fora do mundo real era valorizado. Nesse sentido, o predomínio da emoção supera o cientificismo e o objetivismo do período anterior, mas uma emoção carregada de frustrações e tristezas em decorrência do momento vivido na época.
Características
Principais características da produção artística
- Predominância da emoção;
- O objeto deve estar subentendido, não se mostrando claramente – daí o "símbolo";
- Musicalidade (através de aliterações, assonâncias e outras figuras de
estilo);
- Referências a cores, principalmente à branca;
- Presença de motivos religiosos; a poesia representaria uma espécie de ritual;
- Sonho, imaginação e espiritualismo;
- Subjetividade;
- Culto à forma, com influências parnasianas;
- Uso da figura de linguagem sinestesia, que representa a fusão de
sensações (beijo amargo, cheiro azul), além de outras como personificação e
metáfora;
- Abordagem vaga de impressões subjetivas e/ou sensoriais (Impressionismo),
sobretudo na pintura.
Principais autores e suas obras no Brasil
-
Cruz e Sousa: Broquéis, Missal, Evocações, Faróis, Últimos sonetos.
- Alphonsus de Guimaraens: Setenário das dores de Nossa Senhora, Câmara
ardente, Dona Mística, Kiriale.
- Pedro Kilkerry: Re-visão de Kilkerry (organizado por Augusto de
Campos).
Na França, destacaram-se principalmente Charles Baudelaire, Arthur Rimbaud e Paul Verlaine. E em Portugal, Eugênio de Castro, Antônio Nobre e Camilo Pessanha.
Texto comentado
Braços (Cruz e Souza)
Braços
nervosos, brancas opulências,
Brumais brancuras, fúlgidas brancuras,
Alvuras castas, virginais alvuras,
Lactescências das raras lactescências.
As
fascinantes, mórbidas dormências
Dos teus abraços de letais flexuras,
Produzem sensações de agres torturas,
Dos desejos as mornas florescências.
Braços
nervosos, tentadoras serpes
Que prendem, tetanizam como os herpes,
Dos delírios na trêmula coorte…
Pompa de
carnes tépidas e flóreas,
Braços de estranhas correções marmóreas,
Abertos para o Amor e para a Morte!
João da Cruz e Sousa nasceu em Desterro (atual Florianópolis), em 1861, e morreu em Sítio, Minas Gerais, em 1898. Filho de negros escravos libertados, viveu sob a tutela de um marechal, o que lhe propiciou fazer os estudos secundários. Vítima de preconceito racial, não pôde assumir um cargo público em Laguna, mudando-se para o Rio de Janeiro, onde participou do primeiro grupo de poetas simbolistas. Trabalhou em teatro, quando se frustrou por apaixonar-se por uma artista branca; e, com o escritor Virgílio Várzea, lançou um jornal de cunho republicano e abolicionista.
Considerado um dos maiores poetas simbolistas, Cruz e Sousa buscou a unidade com o mundo cósmico, destacando-se em sua obra a evocação da cor branca, provavelmente pelos problemas que enfrentou por ser negro. Morreu aos 36 anos de idade, vencido pela tuberculose.
Comentários
Neste poema de Cruz e Souza, podemos
observar a referência à cor branca e à pureza pelos termos “fúlgidas, alvuras,
castas, virginais, lactescências, raras”. Isso reflete sua obsessão pela pureza
e pelo mistério, provavelmente por causa da cor de sua pele e pelo preconceito
sofrido. Também há uma relação sensual entre desejo e morte, como em “braços
nervosos, brancas opulências” (v.1) e em “abertos para o Amor e para a Morte”
(v.14).
O poema é dominado por aliterações e assonâncias que estabelecem uma sonoridade vibrante e sibilante em sua leitura, com a utilização de plural como uma das principais marcas dessas figuras de linguagem. As figuras de estilo mais evidentes são as metáforas (v.1 e 2), sinestesia (v. 8 e 5), comparação (v. 10), sinédoque (v.1 e 9) e assíndetos por toda primeira estrofe.
Quanto à linguagem, é culta e sofisticada. Somente na utilização do verbo, “tetanizam”, há neologismo. O termo significa “afetados pela tetania, acometidos por contrações musculares relativas ao tétano”.
Em relação à forma, temos um Soneto, com versos decassílabos em todo o poema, influências da escola anterior – o Parnasianismo –, além da estrutura rítmica variada e o resgate de ritmos.
Por Carmen Pimentel